Friday, June 08, 2007

Solenidade Litúrgica do Corpo e Sangue de Cristo



Ficou por postar algo sobre a data que se celebrou ontem, dia 7 de Junho.
Em Lisboa, como por todo o país, realizou-se pelas cidades, vilas e aldeias a habitual procissão em honra da Solenidade Litúrgica do Corpo e Sangue de Cristo, conhecida popularmente como "Corpo de Deus".
É uma data que faz parte da história de Portugal. Aqui, a data festeja-se desde o reinado de D. Afonso III, portanto desde o século XIII, apesar de ao longo dos anos, o ritual comemorativo tenha sofrido, várias alterações.
A solenidade conhecida pelo nome de Corpus Christi ou do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo, só ganha lugar de relevo na Liturgia em 1246, quando o bispo de Liège instituiu a festa, na sua diocese. Esta primeira “festa oficial” do Corpus Christi surge em consequência das revelações recebidas pela Beata Juliana de Retinne. Pela bula Transiturus (1264), o Papa Urbano IV estendeu a festa a toda a Igreja, como solenidade de adoração da Sagrada Eucaristia. Esta exultação popular à Eucaristia é manifestada no 60° dia após a Páscoa e forçosamente uma Quinta-feira, fazendo assim a união íntima com a Última Ceia de Quinta-feira Santa.
Em 1311 e em 1317 foi novamente recomendada pelo Concílio de Vienne e pelo Papa João XXII, respectivamente. Nos primeiros séculos, a Eucaristia era adorada publicamente, mas só durante o tempo da missa e da comunhão. A conservação da hóstia consagrada fora prevista, originalmente, para levar a comunhão aos doentes e ausentes. É neste mesmo ano pela e mesma mão que o rito da procissão é introduzido e instituído. Hoje, a procissão do Santíssimo Sacramento é recomendada pelo Código de Direito Canónico, no qual se refere que "onde, a juízo do Bispo diocesano, for possível, para testemunhar publicamente a veneração para com a santíssima Eucaristia faça-se uma procissão pelas vias públicas, sobretudo na solenidade do Corpo e Sangue de Cristo" (cân 944, §1). A "comemoração mais célebre e solene do Sacramento memorial da Missa", como dizia o Papa Urbano IV, recebeu várias denominações ao longo dos séculos: festa do Santíssimo Corpo de Nosso Senhor Jesus Cristo; festa da Eucaristia; festa do Corpo de Cristo. Hoje denomina-se solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, e com a sua comemoração, retirou-se do calendário das festas litúrgicas, a festa do "Preciosíssimo Sangue", que se comemorava a 1 de Julho.

Em Portugal a festividade tornou-se característica e marca cultural. Destaca-se claro a igreja dos Mártires, em Lisboa, que manteve, no decurso dos séculos (e apesar das inovações havidas), o rito da festa com exposição do Santíssimo, Procissão, Vésperas solenes e Sermão.
Desde cedo que, no nosso país, as Câmaras Municipais e as Corporações de Artes e Ofícios acolheram a devota iniciativa, pelo que, a Procissão veio a tornar-se a mais vistosa e interessante de todas, merecendo o título de “Procissão das Procissões”. Constituída por cortejo cívico e corporativo, com carros alegóricos, figuras pitorescas, danças, momices e cenas de autos sacramentais, a procissão demorava horas a caminhar, vindo a constituir tanto um evento religioso como um evento social. A festa atingiu a maior grandiosidade no tempo de D. João V. A Procissão incorporava, desde logo, as associações socioprofissionais e também as delegações das diversas Ordens Religiosas de Lisboa (Agostinhos, Beneditinos, Dominicanos, Franciscanos, Ordem de Cristo...) e militares. No cortejo, avultava a figura de S. Jorge a cavalo e a Serpe, ou dragão infernal (do tipo chinês, locomovido por figurantes), contra o qual S. Jorge lutava.
D. João V chegou a encarregar Vieira Lusitano (pintor português), mal este regressou a Portugal após 7 anos de ausência, de fazer um grande quadro do Santíssimo Sacramento para servir na procissão do Corpo de Deus.
No final do cortejo, vinha o palio, a cujas varas pegavam os mais altos dignitários da Corte e da Câmara. Sob o palio, deslocava-se o Bispo de Lisboa, ostentando a custódia com o Santíssimo Sacramento. Era sempre ladeado pelo Rei ou Chefe de Estado.
Outro dado curioso a salientar, e que ainda mais une a celebração religiosa à nossa história, é o das várias tentativas de realização de atentados contra as figuras régias durante a procissão do Corpo de Deus. Um deles contra a pessoa de D. João IV. Sobrevivendo o monarca ao acto, a sua esposa, D. Luísa de Gusmão, promoveu a construção do Convento dos Carmelitas, na Baixa Lisboeta. Edificado no exacto lugar do falhado crime, foi chamado “Convento do Corpus Christi”. Outro atentado famoso deu-se contra D. Manuel II, perto da Igreja da Vitória, quando a procissão passava na rua do Ouro. Mais tarde, com a primeira republica, vieram também as perseguições religiosas - durante a primeira semana de governo republicano, fazem com que nas prisões de Lisboa estejam encarcerados 128 padres e 233 freiras, tendo sido assassinados dois padres lazaristas – e um exemplo delas é a legislação de 1910, que proibia os dias santos da Igreja (excepto o Natal e o dia 1 de Janeiro), e interrompeu o culto público, embora, nas igrejas, continuassem a ser celebradas missas solenes; e solenes pontificiais nas Sés.

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