Friday, October 12, 2007

Duplamente Roubados



Desemprego, falta de produtividade, educação deficiente e corrupção endémica. Estes quatro Cavaleiros do Apocalipse, que nos espreitam ao virar da esquina, já estão suficientemente identificados como sendo as razões do nosso atraso económico e social. Ainda esta semana o Presidente da República insistiu na prioridade da educação, e a corrupção voltou à ribalta com a acusação de João Cravinho de que os dirigentes do PS não lhe dão a importância devida.
Portugal é um país pobre de recursos, mas o nosso atraso não tem de ser assim. Os trabalhadores portugueses, mesmo analfabetos, são tão bons como os outros quando emigram. Nem todos enriquecem, mas a maioria ganha o suficiente para dar uma vida decente à família, amealham para construir uma casa na terra para quando regressarem de férias ou de reforma, e o dinheiro que enviam para Portugal foi durante muitos anos — e ainda é, em parte — um dos mais importantes recursos nacionais. A explicação clássica para esta diferença abismal da produtividade dos portugueses cá dentro ou lá fora é a qualidade empresarial. As nossas empresas são antiquadas, as empresas estrangeiras são modernas. As nossas vivem da mão-de-obra barata, as estrangeiras da maquinaria e das tecnologias. Mas esta é apenas uma parte da explicação, e uma parte menor. Um estudo exaustivo do Banco Mundial sobre a "riqueza das nações" partiu justamente do caso dos emigrantes mexicanos nos Estados Unidos, que são cinco vezes mais produtivos que no seu país, para concluir que o que determina o sucesso económico de um país não é a sua riqueza visível (recursos naturais como o petróleo ou a terra fértil, infra-estruturas como estradas ou fábricas ou capital financeiro) mas aquilo a que chamaram a "riqueza intangível": a confiança das pessoas na sociedade e nas instituições, o bom funcionamento da justiça, e as capacidades e competências humanas. Ou seja, o que faz com que os países prosperem é o seu capital humano e a qualidade das suas instituições. É por isso que a Suíça, um país pobre em recursos naturais, é um dos mais ricos do mundo, e Angola, que nada em petróleo, diamantes e terra fértil, um dos mais pobres.
A responsabilidade pela confiança nas instituições e na justiça depende apenas do Estado. E o Estado, digam o que disserem, não somos nós. Só o somos de quatro em quatro anos, quando votamos. No dia-a-dia são "eles", os ministros, os políticos, os directores-gerais, os funcionários, os juízes, os polícias. Se em Portugal não há uma grande "riqueza intangível" é porque alguém a meteu no bolso, como já se mete a outra riqueza, a tangível. É por isso que a corrupção nos rouba duplamente.

José Júdice ao Jornal O METRO

No comments: